segunda-feira, 6 de julho de 2009

Festas, Danças e Cantos negro

GILFRANCISCO
Jornalista, pesquisador, professor da Faculdade São Luis de França e membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. gilfrancisco.santos@gmail.com

Congada – Consiste num cortejo que desfilava pelos caminhos ou ruas das vilas e cidades, dançando e cantando, indo finalmente, representar uma espécie de Auto ou pequena peça num lugar previamente determinado, geralmente o adro de uma igreja. A congada tinha um rei pelos seus companheiros, uma rainha, príncipes, fidalgos, embaixadores e a representação consistiam em evoluções que podem encontrar um termo de comparação com as modernas escolas de sambas.

Jongos – Uma das festas mais apreciadas devido à grande quantidade de pessoas que dela podia participar. A dança era animada por um cantor e três tambores. O cantador, com um chocalho agitava no meio da roda que se formava e cantava um verso. O coro respondia. O cantador ficava no círculo, cantando, enquanto todos dançavam. O verso era repetido ou não, conforme o interesse despertado pelo sapateador. Às vezes, um homem era provocado por uma mulher que dançava e vinha para o centro da roda, travando-se, então, verdadeiro duelo de dança e sapateio.

Maculelê – De origem muito controvertida, sendo a mais possível, em que é apontado como fragmento do “cucumbis”, como afirma o estudioso baiano Manuel Querino, era autos negros em que os personagens, à maneira angolense, se enfeitavam de penas e peles de animais e arco de flechas, mas em face da repercussão popular dos movimentos nativistas e da literatura indianista, e em especial da extinção do tráfico negreiro, esse folguedo desapareceu na Bahia, mas o jogo de bastões, que constituía um dos episódios, permaneceu e se tornou autônomo.
Maculelê é um bailado guerreiro do Recôncavo baiano, que se exige na festa de Nossa Senhora da Conceição, em Salvador (8 de dezembro) e noutros pontos da Bahia como em Santo Amaro da Purificação (2 de fevereiro). Praticado por dez ou vinte negros de camisa branca de algodão, beiços ampliados e vermelhos, com as esgrimas, facões ou bastões de madeira em cada mão, cantam e dançam entre chocando as armas.
Em santo amaro, cortejo e dança de bastão, recriada pelo negro Popó, que, em meados do século XX, ensinou a coreografia que tinha visto em criança, adicionando música de candomblé e benditos do Divino Espírito Santo por não se lembrar de todas as melodias originais. No dia de Nossa Senhora da Purificação, os componentes saem às ruas andando em cadência, cantam saudações às divindades, ao público e às autoridades.

Samba de Roda – O batuque de Angola chama-se na Bahia “samba” ou “samba de roda”. Há ainda denominações regionais como samba batido, na capital, corta-jaca. O samba de roda parece uma dança rural, que se realizava em engenhos e fazendas do Recôncavo baiano, mas que há muitos anos está em processo de urbanização. Manuel Querino já se refere ao samba a propósito da festa do Bomfim (BA) nos fins do século XIX. É, em verdade nos bairros da Ribeira, na Conceição da Praia e no Largo da Piedade, refugio do samba, por ocasião do carnaval. O samba é uma dança espontânea, a começar pelos instrumentos: um prato de mesa e uma faca, duas colheres de sopa, taubinhas, ou apenas um palmeado simples para agüentar o ritmo.

Samba da Minha Terra

(Dorival Caymmi, gravado em novembro de 1940, pelo Bando da Lua)

O samba da minha terra
Deixa agente mole
Quando se canta
Todo mundo bole
Quem não gosta de samba
Bom sujeito não é
É ruim da cabeça
Ou doente do pé
Eu nasci com o samba
No samba me criei
Do danado do samba
Nunca me separei

O samba requer agilidade e graça do dançarino, especialmente nas pernas e nos pés. Os paços do samba são três: o corta-jaca, separa-o-visgo e apanha-o-bago. As mulheres acrescentam uma faceirice, o passo miudinho, em que os pés mal se movem para avançar ou recuar. O samba tem-se modificado muito. O bamboleio das cadeiras, resultante do movimento dos pés, hoje é parte primordial para certos sambistas, enquanto os pés permanecem inativos. Vejamos esta composição de Gil em parceria com João Augusto, cuja forma poética lembra os repentistas nordestinos cantadores de feira a tirar desafios.

Roda

(Gilberto Gil e João augusto, CS, Phonogram, 1965)

Meu povo preste atenção Deixe o dinheiro do pobre
Na roda que eu te fiz e roube outro ladrão,
Quero mostrar a quem vem agora vou divertir,
Aquilo que o povo diz agora vou prosseguir
Posso falar pois eu sei quero ver quem vai ficar
Eu tiro os outros por mim quero ver quem vai sair
Quando almoço não janto não é obrigado a escutar
E quando canto é assim quem não quiser me ouvir
Agora vou divertir, se morre o rico e o pobre
Agora vou começar, enterre o rico e eu,
Quero ver quem vai sair quero ver quem separa
Quero ver quem vai ficar, o pó do rico do meu.
Não é obrigado a me ouvir se lá embaixo há igualdade
Quem não quiser me escutar aqui em cima há de haver
Quem tem dinheiro no mundo quem quer ser mais do que é
Quanto mais tem, quer ganhar um dia há de sofrer.
E a gente que não tem nada agora vou divertir
Fica pior do que está. Agora vou prosseguir
Seu moço tenha vergonha, quero ver quem vai ficar
Acabe a descaração: quero ver quem vai sair,

Não é obrigado a escutar Não é obrigado a me ouvir
Quem não quiser me ouvir quem não quiser me escutar.
Seu moço, tenha cuidado agora vou terminar,
Com sua exploração, agora vou discorrer,
Senão lhe dou de presente quem sabe tudo e diz logo
A sua cova no chão. fica sem nada a dizer,
Quero ver quem vai dizer, quero ver quem vai voltar,
Quero ver quem vai mentir, quero ver quem vai fugir,
Quero ver quem vai negar quero ver quem vai ficar,
Aquilo que eu disse aqui, quero ver quem vai trair.
Agora vou divertir, Por isso eu fecho essa roda,
Agora vou terminar, a roda que eu fiz,
Quero ver quem vai sair, a roda que é do povo,
Onde se diz o que diz.

Lundu – Dança que também foi canto e muito apreciada, o lundu nasceu nas senzalas baianas, que não tardou a perder a esperteza inicial, subindo aos salões, ao palco dos teatros, acompanhado por “bandolins marchetados”, tornando-se mania, canção nacional. O lundu foi canção sensual e canção satírica, lasciva, tendo havido “lundus só para homens”. O poeta baiano Gregório de Mattos foi um grande cantador de lundus. Proibido e perseguido pelas autoridades durante algum tempo, venceu todas as resistências, acabando por se impor. Clementina de Jesus (1902-1987) consagrou-se na MPB com seu timbre grave e áspero, como grande intérprete de jogos e lundus. Gravou adaptações suas de cantos populares. Vejamos Dois Jongos”.


Pica-pau/Carreiro bebe?

(LP, EMI,1975)

Oi! pica-pau
Pica-pau que
demanda tempo [bis]
barauna

***

Carreiro bebe
candeeiro também bebe
senhor mandou dizer [bis]
que não ensina
boi a bebê


Alguns instrumentos – Atabaques; Adufe; Berimbau; Agogîo; Carimbó; Caxambu; Chocalhos; Fungador; Ganzá; Gongom; Mulungu; Puita; Pandeiro; Quissange; Rincador; Perenga; Socador; Tambor; Ubatá, Xequeré. Vuvu; Triângulo; Balafon.



Balafon

(Gilberto Gil, LP Refavela, 1977)


Isso que toca, bem
Isso que toca bem, bem
Chama-se balafon
Em cada lugar tem
O nome deve ser outro qualquer
No Camerum
Isso que a gente chama marimba
Tem na África todo mesmo som
Isso que toca bem, bem
Num lugar, não lembro bem
Chama-se balafon
Marim-bafé
Iré-xiré
Balafonjá
Orim-axé


Capoeira de Angola – Introduzido no Brasil pelos escravos bantos de Angola, defensivo e ofensivo, espalhado pelo território é tradicional no Recife, cidade do Salvador e Rio de Janeiro, aonde são recordados os mestre, famosos pela agilidade e sucesso. Desde princípios do século XIX, foi reprimido pela Polícia e possuíram devotos e admiradores, de todas as classes, tornando nas festas populares, um perigo de vida assistir à passagem das bandas de músicas ou certos préstitos carnavalescos preferidos por uns grupos e inevitavelmente atacados pelas maltas adversárias, ferindo e maltratando espectadores inocentes. Silvio Romero informa, na segunda metade do século XIX: “A polícia nunca pode extirpar este canero. Os capoeiras usam navalhas como armas e sabem um jogo de pulos, pontapés e cabeçadas todo original”.
Segundo Edison Carneiro os capoeiristas da Bahia denominam o seu jogo de vadiação – e não passa disto a capoeira, tal como se realiza nas festas populares de cidade. Os jogadores se divertem, fingindo lutar, como nesta advertência bem conhecida:

No jogo da capoeira
Quem não joga apanha!

Praticado com movimentos de mãos e principalmente de pernas, exige-se grande perícia. Antigamente exclusivamente de grupos marginalizados, em 1972 foi reconhecido como esporte pelo Conselho Nacional de Desportos – CND. É difundido hoje em escolas e academias, freqüentadas por pessoas de qualquer idade e de ambos os sexos.
No Brasil existem cerca de cinco milhões de praticantes, distribuídos, principalmente, pelos Estados da Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro. Tradicionalmente é jogada ao som de berimbau, ganzá, pandeiro e caxixis e, qual uma dança, obedece a figuras (golpes) determinadas. As principais são: rasteiras, rabo-de-saia, meia-lua, chapa-de-ré, tesoura, aú de macaco (pulo do macaco), rabo-de-araia, a mais popular de todas, consiste em cair sobre as mãos e rodar o corpo ao encontro do adversário, derrubando-o violentamente ao solo com três variantes: o rabo de frente, o rabo com as duas pernas e o rabo com uma perna de lado.


Lapinha

(Baden Powell e Paulo César Pinheiro)


Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Calça, culote, palitó almofadinha
Calça, culote, politó almofadinha
Vai meu lamente vai contar
Toda tristeza de viver
Ai a verdade sempre trai
E às vezes traz um mal a mais
Ai só me fez dilacerar
Ver tanta gente se entregar
Mas não me conformei
Indo contra lei
Sei que não me arrependi
Tenho um pedido só
Último talvez, antes de partir
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Calça, culote, palito almofadinha
Calça, culote, palito almofadinha
Sai minha mágoa
Sai de mim
Há tanto coração num
Ai é tão desesperador
O amor perder do desamor
Ah tanto erra eu vi, lutei
E como perdedor gritei
Que eu sou um homem só
Sem saber mudar
Nunca mais vou lastimar
Tenho um pedido só
Último talvez, antes de morrer
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Calça, culote, politó almofadinha
Calça, culote, politó almofadinha
Adeus Bahia, zum-zum-zum
Cordão de ouro
Eu vou partir porque mataram meu besouro.







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