Aos
poucos, em torno da sua mesa de café, Samuel Brito foi reunindo jovens
procedentes de várias classes sociais (bacharéis, estudantes, funcionários
públicos e um operário-alfaiate), para reuniões informais dos que freqüentavam
o Café Progresso, onde serviu de palco para as discussões e projetos do grupo,
que surgiu entre os fins dos anos de 1925 a 1929. Além de discutirem literatura
e principalmente poesia, questões gramaticais, fatos políticos e do cotidiano,
o noticiário dos jornais e a vida das pessoas. A denominação de Baixinha era
porque o Café Progresso estava situado próximo a um larguinho, de onde
despontam as ladeiras do Carmo, do Passo e do Pelourinho, e que ligam a Baixa
dos Sapateiros ao Taboão. Além do Café Progresso, neste espaço e arredores estava
outros cafés: Café Moderno, Café Derby e Café Artúrio. O Café Progresso, era
modesto, proletário, quase sujo, freqüentado por gente humilde que ali entrava
rapidamente para tornar uma média de café com pão e manteiga ou apenas um
cafezinho simples, que custava dois tostões.[2]
O Grupo da Baixinha, que era formado por rapazes de 18 a 21 anos de idade, boêmios talentosos que improvisando e escrevendo literatura em cafés e bares, que "enchiam com as notas vivas e inteligentes de sua alegria ruidosa[3]". Pinheiro Viegas retorna à Bahia em fins de 1924, passando a freqüentar alguns cafés situados na antiga Rua do Colégio, tais como o Peres, Madrid, Derby e posteriormente o Café Bahia. A partir de 1926, Viegas associaria ao Grupo da Baixinha, que passou a disputar a liderança com Samuel de Brito Filho, o Guarda Civil, 85. Samuel morreu em 1929, conforme o poema Gênese, de Elpídio Bastos, dedicado à sua memória.[4]
O Grupo da Baixinha tinha como mecenas Raimundo Pena Forte, “perneta que arrastava até nós na sua muleta para assistir às nossas tertúlias sem ter, todavia, qualquer veleidade intelectual. Gostava, apenas, de comparecer às nossas reuniões e de pagar a nossa despesa resultante dos cafezinhos e do pãozinho quente que devorávamos altas horas da noite, recém-saído do forno da Padaria Montanha”.[5] O poeta Otto Bittencourt Sobrinho em artigo publicado na revista O Social, afirma que “foi Alves Ribeiro o organizador dessa campanha. Chamou a si Clodoaldo Milton, Bráulio Abreu, Elpidio Bastos, Egberto Ribeiro, e outros, e fundou o “Samba”. A primeira revista moderna. O estandarte da nova cruzada. Simples. Porém quanta coisa linda que ela trouxe.”[6]
Segundo o poeta Elpídio Bastos, Pinheiro Viegas “era uma personagem fria, incapaz de demonstrar um sentimento mais expressivo, tomar uma atitude constrangedora de pesar ou mesmo de expansiva alegria. Raramente o vimos rir, levado por qualquer contentamento ou se estarrecer diante de uma surpresa”[7]. Seu ingresso no grupo representa uma nova fase para a agremiação, inclusive seus membros passaram a freqüentar outros cafés de melhor aparência, na área da antiga Sé.[8]
Definida como Mensário Modernista de Letras, Artes e Pensamento, a revista Samba (1928-1929) teve apenas quatro números publicados, e suas páginas não numeradas. A revista Samba, tinha uma mancha de 24,5X16,5. O número 1, em novembro de 1928, aparece com 14 páginas, sendo que cinco totalmente dedicada a publicidade; número 2 em dezembro de 1928, aumentaria mais quatro páginas, sendo seis exclusivamente para publicidade geral; o número 3, fevereiro de 1929 continha 16 páginas, sendo que quatro para anúncios comerciais e finalmente, o quarto e último número, março de 1929, continha 18 páginas, sete destinadas a publicidade.
A maioria dos anúncios publicitários era das casas comerciais da Baixa dos Sapateiros: lojas de calçados, marcenarias e carpintarias, alfaiatarias, lojas de miudezas, lojas de chapéus, bazares, tipografias, armazéns, casas funerárias, armarinhos, tinturarias, oficinas mecânicas, lojas de ferragens, farmácias e cafés. Tendo como diretor Gomes Costa, era patrocinada pelo espanhol Severino Pazos Martinez. O endereço oficial indicava a Rua Silva Jardim, nº 58 – Taboão, no entanto, a revista era preparada nas mesas do Café Progresso. Tanto Samba quanto Arco & Flexa (1928-1929), surgiram simultaneamente no mês de novembro de 1928, antecedendo-se (Samba), alguns dias seu lançamento, o que lhe confere o privilégio de ter sido a primeira revista com feição modernista editada na Bahia.
Samba era uma revista simples, feita de papel jornal, que teve o nome dado por Alves Ribeiro, na época com dezenove anos de idade e é quem apresenta o primeiro número da revista com artigo manifesto intitulado Samba:
“A arte moderna procura, acima de tudo, a alegria. Daí, essa nota de jovialidade e humorismo que a caracteriza... O conceito de Wilde, definindo a arte como uma enfermidade, aplica-se muito bem ao século passado. Em verdade, a arte do século XIX foi mais ou menos enferma. Porém, deixemos o pretérito. Cuidemos do presente e do futuro. Estamos atualmente, na época das grandes agitações sociais. Há uma revolução completa em todas as manifestações do espírito humano. Novos surtos. Novas idéias. Novos horizontes... Não podemos ser indiferentes ao que se passa no resto do mundo. Queremos uma arte nova, cheia de vida, entusiasmo e vibração. Uma arte sã, enfim... Não temos tempo a perder com jeremiadas. A dor é um tóxico. O riso é um contra veneno. Quem para, a desfiar mágoas, fica na retaguarda. é preciso ir avante!
Viver é integrar-se no dinamismo das coisas, vibrar na homogeneidade do cosmos... A tristeza é uma doença. A alegria é bela higiênica. Sejamos alegres. Alegres e resolutos. Só assim seremos grandes e felizes. Ou, pelo menos, teremos a ilusão da grandeza e da felicidade. A arte moderna deve ser, pois, uma arte de rejuvenescimento. Viva a alegria! Viva o samba!...”[9]
Fizeram parte do grupo da Baixinha: Alves Ribeiro, Anibal Rocha, Amphilophio Britto, Ângelo Brandão Donatti, Bráulio de Abreu, Clodoaldo Milton, Dagmar Pinto, De Souza Aguiar, Epaminondas Pontes, Elpídio Bastos, Egberto de Campos Ribeiro, Honorato Gomes, Leite Filho, Nonato Marques, Otto Bittencourt Sobrinho, Pereira Reis Júnior, Pinheiro Viegas, Raimundo Pennafort, Samuel de Brito Filho, Wasny Casaes e Zaluar de Carvalho.
Após a publicação do último número da revista, o grupo se desfez em conseqüência de desentendimentos entre alguns dos seus componentes e Pinheiro Viegas, principalmente com Otto Bittencourt, que a partir desta época mereceu inúmeros epigramas.
Apesar da confirmação de Bráulio de Abreu e Nonato Marques, de que não fora publicado o número 5 da revista Samba, encontramos duas notas registrando a publicação do periódico. A primeira no Diário de Notícias: “Samba – E seu magnífico número de hoje. O número 5 de Samba, a revista bem feita da gente moça e de talento da Bahia, saiu, hoje, à circulação”.[10] A segunda, n’O Social (órgão defensor da classe caixeiral, do cooperativismo e das sociedades civis), publicação quinzenal dirigida por Veriano Raul Pedrão, quatro meses após a publicação do nº4, o seguinte registro: “Está circulando o 5º número de Samba, revista moderna, a que a inteligência empresta uma grande vida. Alves Ribeiro abre esse número com um excelente artigo sobre a literatura moderna. Seguem-se prosa e verso de Bráulio de Abreu, Clodoaldo Milton, Otto Bittencourt Sobrinho, Egberto de Campos Ribeiro, De Souza Aguiar, Elpídio Bastos e outros. Mas ótimo de verdade”.[11]
Segundo Bráulio “Não sei, ignoro completamente, se chegou a sair o nº5 de Samba. Tínhamos a obrigação de cada um abrir um número da revista. Isso foi estabelecido pelo Alves Ribeiro, que era o maior esclarecido de nosso grupo”.[12]
Vejamos o registro das publicações dos quatro números de Samba, na revista O Social: “SAMBA – temos em mãos o primeiro número de Samba. É uma revista nova, a primeira que, na Bahia, conseguiu romper os velhos moldes de Arte. Assina suas colaborações um punhado de moços inteligentes e corajosos, destacando-se: Altamirando Requião, Áureo Contreiras, Alves Ribeiro, Otto Bittencourt Sobrinho, Egberto de Campos Ribeiro, Elpidio Bastos, Florêncio Santos, Aníbal Rocha, Bráulio de Abreu, Clodoaldo Milton e Costa Andrade. Está de parabéns a intelectualidade moça da nossa terra. E por isso, almejamos a Samba uma vida longa”.[13]
SAMBA – está em circulação o seguinte número dessa apreciável revista. De uma confecção esmerada, trazendo colaboração escolhida em prosa e verso, SAMBA é, realmente, uma revista nova, dos novos e para os novos. A essa plêiade de moços que idealizou e realizou SAMBA. O Social envia parabéns”.[14] “SAMBA – Já está circulando o terceiro número de SAMBA. Um número bem feito, bem confeccionado, sob a gerência do Sr. Gomes da Costa. Trás esmerada colaboração, todas nos moldes da Arte Nova; dia a dia, tem maior número de adeptos. SAMBA é já uma revista vitoriosa. Muito modesta, porém muito boa. São seus redatores e colaboradores efetivos os intelectuais Alves Ribeiro, Bittencourt Sobrinho, Clodoaldo Milton, Bráulio de Abreu, Elpidio Bastos, Egberto Ribeiro. SAMBA foi a primeira revista moderna, essencialmente moderna, editada na Bahia”.[15] “SAMBA – Aperte os nossos, Elpidio Bastos. E vocês, Alves Ribeiro, Clodoaldo Milton, Bráulio de Abreu, Bittencourt Sobrinho, Dagmar Pinto, todos vocês aceitem os parabéns sinceros de O Social. O 4º número de SAMBA está um número.
Um número bem feito, bem organizado. Não resta dúvida que SAMBA este vencendo. Para dizer melhor já venceu. E logicamente, assim tinha de ser.
Vencum, porque vocês estão à sua frente, destemidos, desassombrados. E mais do que tudo, SAMBA é uma prova exuberante do talento de vocês todos. Talento e força de vontade. Um abraço”.[16]
O Grupo da Baixinha se manteve basicamente conservador, onde seus integrantes continuavam cultivando o verso rigorosamente metrificado, no melhor estilo parnasiano, porque ninguém se arriscava a seguir as idéias do futurismo. “Com tais posições estes jovens servem de elo entre a literatura finissecular tristonha e patriótica e o fazer literatura na Bahia naquela década de vinte, tentativa de integração moderada no quadro literário brasileiro.”[17]
Grupo "rival" de Arco & Flexa, tendo como principal motivo a formação intelectual de seus membros, que desfrutavam de grande prestígio na Velha Capital e representavam o núcleo central da inteligência baiana na época, como Godofredo Filho, Hélio Simões, Pinto de Aguiar, Carvalho Filho e outros. Pois nenhum dos integrantes de Samba tiveram acesso à Academia de Letras da Bahia, em virtude dos poetas da Baixinha serem modestos demais para aspirar tão grande sonho. [18]
O certo é que até hoje, a Academia de Letras da Bahia não perdeu os seus pendores elitistas porque o ingresso a esta agremiação não se faz por talento literário, mas por interesses políticos. E sobre isso afirma o poeta Bráulio de Abreu:[19] “Nós nunca tivemos uma cor política. Éramos quase independentes a esse negócio. Cada um fazia o que queria, mas como grupo reunido para trabalhar por um princípio político nunca houve isso. Cada um fazia o que queria fazer.” [20]
O grupo, publicou dois semanários malucos pelos 200 réis. Primeiro surgiu O Periquito, depois promovido a Gavião, classificados como “órgão de ataques de riso.” Não escapava ninguém às bicadas do Periquito, ou às garras do Gavião. [21]
A revista Samba, de qualquer forma deixou registrada sua presença na história da vida literária baiana dos anos vinte, sendo testemunhada pelos poetas Nonato Marques, com 89 anos e Bráulio de Abreu com 97 anos de idade, únicos remanescentes do grupo de poetas da Baixinha.
O escritor Jorge Amado, amigo e companheiro de Pinheiro Viegas, em seu livro de estréia "O País do Carnaval", deixa gravado na história o nome de Pinheiro Viegas, colocando-o como um dos personagens (Pedro Ticiano) mais importantes deste seu livro, procurando relatar a vida literária da época, fazendo uma verdadeira sociologia da vida intelectual baiana.[22]
O romance "O País do Carnaval", cuja metáfora do título é bem explícita: o Brasil, representado pela geração do personagem Paulo Rigger, é uma nação que ainda não se definiu, que ainda não tomou partido, alienando-se da realidade. Neste livro, Jorge Amado procura traduzir o clima de incerteza de sua própria geração. Viegas, cujo personagem é Pedro Ticiano tinha uma vocação diabólica, envenenador, pessimista sistemático, um sexagenário satânico, a sua má língua chibatava todos os preconceitos, arrastando consigo uma plêiade de homens de talento. Viegas tinha o poder de inutilizar um jornal com um epigrama e apagar uma esperança com uma frase.
O decênio de 1930 é marcado, no mundo inteiro, por um recrudescimento da luta ideológica: fascismo, nazismo, comunismo, socialismo e liberalismo medem suas forças em disputa ativa; os imperialismos se expandem, o capitalismo monopolista se consolida e, em contrapartida, as Frentes Populares se organizam para enfrentá-los. No Brasil, é a fase de crescimento do Partido Comunista, da Organização da Aliança Nacional Libertadora, da Ação Integralista de Getúlio Vargas e seu populismo trabalhista. O resultado não se fez esperar: assumindo cada vez mais o poder, Getúlio interveio nos sindicatos, oprimiu o operariado e calou a voz da oposição.
O ditador endurece ainda mais o regime, tendo como resultado, em 10 de novembro de 1937, a concessão de maiores poderes a si próprio, a nomeação de interventores para os estados e a criação da censura prévia.
A consciência da luta de classe, embora de forma confusa, penetra em todos os lugares – na literatura inclusive, e com uma profundidade que vai causar transformações importantes.
O Grupo da Baixinha, que era formado por rapazes de 18 a 21 anos de idade, boêmios talentosos que improvisando e escrevendo literatura em cafés e bares, que "enchiam com as notas vivas e inteligentes de sua alegria ruidosa[3]". Pinheiro Viegas retorna à Bahia em fins de 1924, passando a freqüentar alguns cafés situados na antiga Rua do Colégio, tais como o Peres, Madrid, Derby e posteriormente o Café Bahia. A partir de 1926, Viegas associaria ao Grupo da Baixinha, que passou a disputar a liderança com Samuel de Brito Filho, o Guarda Civil, 85. Samuel morreu em 1929, conforme o poema Gênese, de Elpídio Bastos, dedicado à sua memória.[4]
O Grupo da Baixinha tinha como mecenas Raimundo Pena Forte, “perneta que arrastava até nós na sua muleta para assistir às nossas tertúlias sem ter, todavia, qualquer veleidade intelectual. Gostava, apenas, de comparecer às nossas reuniões e de pagar a nossa despesa resultante dos cafezinhos e do pãozinho quente que devorávamos altas horas da noite, recém-saído do forno da Padaria Montanha”.[5] O poeta Otto Bittencourt Sobrinho em artigo publicado na revista O Social, afirma que “foi Alves Ribeiro o organizador dessa campanha. Chamou a si Clodoaldo Milton, Bráulio Abreu, Elpidio Bastos, Egberto Ribeiro, e outros, e fundou o “Samba”. A primeira revista moderna. O estandarte da nova cruzada. Simples. Porém quanta coisa linda que ela trouxe.”[6]
Segundo o poeta Elpídio Bastos, Pinheiro Viegas “era uma personagem fria, incapaz de demonstrar um sentimento mais expressivo, tomar uma atitude constrangedora de pesar ou mesmo de expansiva alegria. Raramente o vimos rir, levado por qualquer contentamento ou se estarrecer diante de uma surpresa”[7]. Seu ingresso no grupo representa uma nova fase para a agremiação, inclusive seus membros passaram a freqüentar outros cafés de melhor aparência, na área da antiga Sé.[8]
Definida como Mensário Modernista de Letras, Artes e Pensamento, a revista Samba (1928-1929) teve apenas quatro números publicados, e suas páginas não numeradas. A revista Samba, tinha uma mancha de 24,5X16,5. O número 1, em novembro de 1928, aparece com 14 páginas, sendo que cinco totalmente dedicada a publicidade; número 2 em dezembro de 1928, aumentaria mais quatro páginas, sendo seis exclusivamente para publicidade geral; o número 3, fevereiro de 1929 continha 16 páginas, sendo que quatro para anúncios comerciais e finalmente, o quarto e último número, março de 1929, continha 18 páginas, sete destinadas a publicidade.
A maioria dos anúncios publicitários era das casas comerciais da Baixa dos Sapateiros: lojas de calçados, marcenarias e carpintarias, alfaiatarias, lojas de miudezas, lojas de chapéus, bazares, tipografias, armazéns, casas funerárias, armarinhos, tinturarias, oficinas mecânicas, lojas de ferragens, farmácias e cafés. Tendo como diretor Gomes Costa, era patrocinada pelo espanhol Severino Pazos Martinez. O endereço oficial indicava a Rua Silva Jardim, nº 58 – Taboão, no entanto, a revista era preparada nas mesas do Café Progresso. Tanto Samba quanto Arco & Flexa (1928-1929), surgiram simultaneamente no mês de novembro de 1928, antecedendo-se (Samba), alguns dias seu lançamento, o que lhe confere o privilégio de ter sido a primeira revista com feição modernista editada na Bahia.
Samba era uma revista simples, feita de papel jornal, que teve o nome dado por Alves Ribeiro, na época com dezenove anos de idade e é quem apresenta o primeiro número da revista com artigo manifesto intitulado Samba:
“A arte moderna procura, acima de tudo, a alegria. Daí, essa nota de jovialidade e humorismo que a caracteriza... O conceito de Wilde, definindo a arte como uma enfermidade, aplica-se muito bem ao século passado. Em verdade, a arte do século XIX foi mais ou menos enferma. Porém, deixemos o pretérito. Cuidemos do presente e do futuro. Estamos atualmente, na época das grandes agitações sociais. Há uma revolução completa em todas as manifestações do espírito humano. Novos surtos. Novas idéias. Novos horizontes... Não podemos ser indiferentes ao que se passa no resto do mundo. Queremos uma arte nova, cheia de vida, entusiasmo e vibração. Uma arte sã, enfim... Não temos tempo a perder com jeremiadas. A dor é um tóxico. O riso é um contra veneno. Quem para, a desfiar mágoas, fica na retaguarda. é preciso ir avante!
Viver é integrar-se no dinamismo das coisas, vibrar na homogeneidade do cosmos... A tristeza é uma doença. A alegria é bela higiênica. Sejamos alegres. Alegres e resolutos. Só assim seremos grandes e felizes. Ou, pelo menos, teremos a ilusão da grandeza e da felicidade. A arte moderna deve ser, pois, uma arte de rejuvenescimento. Viva a alegria! Viva o samba!...”[9]
Fizeram parte do grupo da Baixinha: Alves Ribeiro, Anibal Rocha, Amphilophio Britto, Ângelo Brandão Donatti, Bráulio de Abreu, Clodoaldo Milton, Dagmar Pinto, De Souza Aguiar, Epaminondas Pontes, Elpídio Bastos, Egberto de Campos Ribeiro, Honorato Gomes, Leite Filho, Nonato Marques, Otto Bittencourt Sobrinho, Pereira Reis Júnior, Pinheiro Viegas, Raimundo Pennafort, Samuel de Brito Filho, Wasny Casaes e Zaluar de Carvalho.
Após a publicação do último número da revista, o grupo se desfez em conseqüência de desentendimentos entre alguns dos seus componentes e Pinheiro Viegas, principalmente com Otto Bittencourt, que a partir desta época mereceu inúmeros epigramas.
Apesar da confirmação de Bráulio de Abreu e Nonato Marques, de que não fora publicado o número 5 da revista Samba, encontramos duas notas registrando a publicação do periódico. A primeira no Diário de Notícias: “Samba – E seu magnífico número de hoje. O número 5 de Samba, a revista bem feita da gente moça e de talento da Bahia, saiu, hoje, à circulação”.[10] A segunda, n’O Social (órgão defensor da classe caixeiral, do cooperativismo e das sociedades civis), publicação quinzenal dirigida por Veriano Raul Pedrão, quatro meses após a publicação do nº4, o seguinte registro: “Está circulando o 5º número de Samba, revista moderna, a que a inteligência empresta uma grande vida. Alves Ribeiro abre esse número com um excelente artigo sobre a literatura moderna. Seguem-se prosa e verso de Bráulio de Abreu, Clodoaldo Milton, Otto Bittencourt Sobrinho, Egberto de Campos Ribeiro, De Souza Aguiar, Elpídio Bastos e outros. Mas ótimo de verdade”.[11]
Segundo Bráulio “Não sei, ignoro completamente, se chegou a sair o nº5 de Samba. Tínhamos a obrigação de cada um abrir um número da revista. Isso foi estabelecido pelo Alves Ribeiro, que era o maior esclarecido de nosso grupo”.[12]
Vejamos o registro das publicações dos quatro números de Samba, na revista O Social: “SAMBA – temos em mãos o primeiro número de Samba. É uma revista nova, a primeira que, na Bahia, conseguiu romper os velhos moldes de Arte. Assina suas colaborações um punhado de moços inteligentes e corajosos, destacando-se: Altamirando Requião, Áureo Contreiras, Alves Ribeiro, Otto Bittencourt Sobrinho, Egberto de Campos Ribeiro, Elpidio Bastos, Florêncio Santos, Aníbal Rocha, Bráulio de Abreu, Clodoaldo Milton e Costa Andrade. Está de parabéns a intelectualidade moça da nossa terra. E por isso, almejamos a Samba uma vida longa”.[13]
SAMBA – está em circulação o seguinte número dessa apreciável revista. De uma confecção esmerada, trazendo colaboração escolhida em prosa e verso, SAMBA é, realmente, uma revista nova, dos novos e para os novos. A essa plêiade de moços que idealizou e realizou SAMBA. O Social envia parabéns”.[14] “SAMBA – Já está circulando o terceiro número de SAMBA. Um número bem feito, bem confeccionado, sob a gerência do Sr. Gomes da Costa. Trás esmerada colaboração, todas nos moldes da Arte Nova; dia a dia, tem maior número de adeptos. SAMBA é já uma revista vitoriosa. Muito modesta, porém muito boa. São seus redatores e colaboradores efetivos os intelectuais Alves Ribeiro, Bittencourt Sobrinho, Clodoaldo Milton, Bráulio de Abreu, Elpidio Bastos, Egberto Ribeiro. SAMBA foi a primeira revista moderna, essencialmente moderna, editada na Bahia”.[15] “SAMBA – Aperte os nossos, Elpidio Bastos. E vocês, Alves Ribeiro, Clodoaldo Milton, Bráulio de Abreu, Bittencourt Sobrinho, Dagmar Pinto, todos vocês aceitem os parabéns sinceros de O Social. O 4º número de SAMBA está um número.
Um número bem feito, bem organizado. Não resta dúvida que SAMBA este vencendo. Para dizer melhor já venceu. E logicamente, assim tinha de ser.
Vencum, porque vocês estão à sua frente, destemidos, desassombrados. E mais do que tudo, SAMBA é uma prova exuberante do talento de vocês todos. Talento e força de vontade. Um abraço”.[16]
O Grupo da Baixinha se manteve basicamente conservador, onde seus integrantes continuavam cultivando o verso rigorosamente metrificado, no melhor estilo parnasiano, porque ninguém se arriscava a seguir as idéias do futurismo. “Com tais posições estes jovens servem de elo entre a literatura finissecular tristonha e patriótica e o fazer literatura na Bahia naquela década de vinte, tentativa de integração moderada no quadro literário brasileiro.”[17]
Grupo "rival" de Arco & Flexa, tendo como principal motivo a formação intelectual de seus membros, que desfrutavam de grande prestígio na Velha Capital e representavam o núcleo central da inteligência baiana na época, como Godofredo Filho, Hélio Simões, Pinto de Aguiar, Carvalho Filho e outros. Pois nenhum dos integrantes de Samba tiveram acesso à Academia de Letras da Bahia, em virtude dos poetas da Baixinha serem modestos demais para aspirar tão grande sonho. [18]
O certo é que até hoje, a Academia de Letras da Bahia não perdeu os seus pendores elitistas porque o ingresso a esta agremiação não se faz por talento literário, mas por interesses políticos. E sobre isso afirma o poeta Bráulio de Abreu:[19] “Nós nunca tivemos uma cor política. Éramos quase independentes a esse negócio. Cada um fazia o que queria, mas como grupo reunido para trabalhar por um princípio político nunca houve isso. Cada um fazia o que queria fazer.” [20]
O grupo, publicou dois semanários malucos pelos 200 réis. Primeiro surgiu O Periquito, depois promovido a Gavião, classificados como “órgão de ataques de riso.” Não escapava ninguém às bicadas do Periquito, ou às garras do Gavião. [21]
A revista Samba, de qualquer forma deixou registrada sua presença na história da vida literária baiana dos anos vinte, sendo testemunhada pelos poetas Nonato Marques, com 89 anos e Bráulio de Abreu com 97 anos de idade, únicos remanescentes do grupo de poetas da Baixinha.
O escritor Jorge Amado, amigo e companheiro de Pinheiro Viegas, em seu livro de estréia "O País do Carnaval", deixa gravado na história o nome de Pinheiro Viegas, colocando-o como um dos personagens (Pedro Ticiano) mais importantes deste seu livro, procurando relatar a vida literária da época, fazendo uma verdadeira sociologia da vida intelectual baiana.[22]
O romance "O País do Carnaval", cuja metáfora do título é bem explícita: o Brasil, representado pela geração do personagem Paulo Rigger, é uma nação que ainda não se definiu, que ainda não tomou partido, alienando-se da realidade. Neste livro, Jorge Amado procura traduzir o clima de incerteza de sua própria geração. Viegas, cujo personagem é Pedro Ticiano tinha uma vocação diabólica, envenenador, pessimista sistemático, um sexagenário satânico, a sua má língua chibatava todos os preconceitos, arrastando consigo uma plêiade de homens de talento. Viegas tinha o poder de inutilizar um jornal com um epigrama e apagar uma esperança com uma frase.
O decênio de 1930 é marcado, no mundo inteiro, por um recrudescimento da luta ideológica: fascismo, nazismo, comunismo, socialismo e liberalismo medem suas forças em disputa ativa; os imperialismos se expandem, o capitalismo monopolista se consolida e, em contrapartida, as Frentes Populares se organizam para enfrentá-los. No Brasil, é a fase de crescimento do Partido Comunista, da Organização da Aliança Nacional Libertadora, da Ação Integralista de Getúlio Vargas e seu populismo trabalhista. O resultado não se fez esperar: assumindo cada vez mais o poder, Getúlio interveio nos sindicatos, oprimiu o operariado e calou a voz da oposição.
O ditador endurece ainda mais o regime, tendo como resultado, em 10 de novembro de 1937, a concessão de maiores poderes a si próprio, a nomeação de interventores para os estados e a criação da censura prévia.
A consciência da luta de classe, embora de forma confusa, penetra em todos os lugares – na literatura inclusive, e com uma profundidade que vai causar transformações importantes.
Notas)
(*)Salvador. O Social, Elpidio
Bastos (Gênese). Ano II, nº 21/22- 30 de novembro, 1929
[1]
DAMULAKIS, Geranda. Poetas da Baixinha, Revista da Bahia. Salvador: nº22, p.
50-55, novembro, 1996.
[2]
MARQUES, Nonato. A Poesia era uma Festa. Salvador: GraphCo, p. 15, 1994. Neste
livro, o autor fez um relato sobre a vida literária e a atividade política na
Bahia da década de 20, fixando no Grupo que se convencionou chamar os poetas da
Baixinha.
[3]
Idem, Idem.
[4]
Salvador. O Social, Elpidio Bastos (Gênese). Ano II, nº 21/22 – 30 de novembro,
1929.
[5]
MARQUES, Nonato. A Poesia era uma Festa. p. 15-16.
[6]
Salvador. O Social, Otto B. Sobrinho (Samba). Ano II, nº1, 15 de janeiro, 1929.
[7]
MARQUES, Nonato. A Poesia era uma Festa, p 30.
[8] A Sé da Bahia, erguida a partir de 1552, nas
suas primeiras fundações, pelo famoso Bispo Sardinha, onde pregaram os padre
Antonio Vieira e Eusébio de Mattos teve sua demolição iniciada em 7 de agosto de 1933.
A Igreja ficava no espaço compreendido entre a Santa Casa de Misericórdia e
Palácio da Arquidiocese, onde hoje está o Belvedere, indo até defronte do
prédio da casa A Primavera.
[10]
Diário de Notícias, 13 de julho, 1929.
[12]
Samba.
Salvador, Edição fac-similar, “Samba morreu de desgosto”, Bráulio de Abreu,
Conselho Estadual de Cultura, 2000.
[14]
O Social. Salvador, Revistas & Jornais, Ano I, nº1, 15 de janeiro, 1929.
[15]
O Social. Salvador, Revistas & Jornais, Ano II, nº4, 28 de fevereiro, 1929.
[16]
O Social. Salvador, Ano II, nº6, Bahia,
30 de março, 1929.
[17]
ALVES,
Ívia. Uma breve notícia sobre Samba, Revista Exu. Salvador: Fundação Casa de
Jorge Amado, nº 1, p. 9, nov./dez. 1987. MARQUES, Nonato. A Poesia era uma
Festa. Salvador: GraphCo, p. 139, 1994.
[18] Carlos
Chiacchio publicaria em seis rodapés sucessivos de A Tarde (14. 02. 1928) sobre
Modernistas & Ultramodernistas, mostrando claramente não adesão às idéias modernistas
que agitavam os grandes centros literários do Rio e São Paulo. Isto significava
preservar o passado.
[19] A
Academia de Letras da Bahia foi criada em 1917, adotando o mesmo modelo da
Academia Brasileira de Letras, que por sua vez, copiara da Academia Francesa.
Foi constituída, na sua maior parte, por elementos que pertenciam à Nova
Cruzada.
[20] ABREU,
Bráulio de. Entrevista, Revista Exu. Salvador: Fundação Casa de Jorge Amado, nº
1, p. 5-9, dez. 1987.
[22]
AMADO,
Jorge. O País do Carnaval. Rio de Janeiro: Schmidt, 1931. Este romance, até
1992 havia sido traduzido para dois idiomas: francês e italiano.